Avaliação de governo, ideologia e voto para presidente em 2002 e 2006 no Brasil.

Andressa Buture Kniess.


(Post de 17/02/2017 migrado do antigo site do CPOP)

O comportamento eleitoral dos eleitores brasileiros é uma questão que está longe de ser completamente solucionada, visto que a decisão do voto envolve elementos de longo, médio e curto prazo. Os dados aqui apresentados investigam a perspectiva de Singer (2012) acerca do Lulismo e a capacidade explicativa da avaliação de governo, da participação em manifestações ou protestos e da identificação ideológica na decisão do voto para presidente, em 2002 e 2006, considerando os eleitores com renda familiar mensal de até dois salários mínimos. Singer (2012) propõe uma análise acerca da decisão do voto em Lula para presidente em 2002 e 2006. Para o autor, os eleitores com renda familiar mensal de até dois salários mínimos não votaram em Lula nas eleições presidenciais de 1989, 1994, 1998 e 2002, por suas opiniões políticas conservadoras e porque identificavam o candidato do PT como liderança grevista. Essa camada social apenas votou em Lula para presidente em 2006, já que foi beneficiada pelo seu primeiro governo. A partir da perspectiva de Singer e da literatura acerca do comportamento eleitoral do eleitor brasileiro, foram formuladas duas hipóteses: 1) Há, em 2002, uma tendência de o eleitor de baixa renda não votar em Lula, não participar de manifestações ou protestos, identificar-se mais à direita no espectro ideológico e avaliar positivamente os últimos quatro anos do governo de Fernando Henrique Cardoso; 2) Há, em 2006, uma tendência de o eleitor de baixa renda votar em Lula, não participar de manifestações ou protestos, identificar-se mais à direita no espectro ideológico e avaliar positivamente o primeiro governo Lula. Os resultados são provenientes dos surveys o Estudo Eleitoral Brasileiro, para as análises de 2002, e “A cultura política da democracia”, realizado pelo Latin American Public Opinio Project, para as análises de 2006.

O Quadro 1 mostra que não há diferença estatisticamente significativa entre renda e decisão de voto em ambos os turnos da eleição presidencial de 2002, visto que o x² está muito acima do limite crítico. Em relação à avaliação de governo, há uma tendência de que eleitores de baixa renda avaliem melhor o segundo governo FHC, em 2002. Acerca da participação em manifestações ou protestos e da identificação ideológica, há diferença estatisticamente significativa, ou seja, a frequência de respondentes que nunca participaram desses eventos é maior entre os eleitores de baixa renda e há uma tendência de que esses eleitores se posicionem mais à direita no espectro ideológico. Entretanto, os valores de contingência indicam baixas correlações entre as variáveis. É importante observar que a adesão a greves não é suficiente para definir o eleitor como politicamente conservador. Inclusive, essa é uma das críticas feitas a Singer (2012) por Boito (2013). “É certo que existe um tipo de conservadorismo popular. Mas a definição da natureza desse fenômeno e a mensuração de sua extensão carecem de mais pesquisas.” (BOITO, 2013, p. 177). A primeira hipótese foi, portanto, em parte refutada. Há uma tendência, em 2002, de avaliações positivas acerca do segundo governo FHC, da não participação em manifestações ou protestos e de posicionamento mais à direita na escala ideológica por parte dos eleitores de baixa renda. Entretanto, a renda não explica o voto para presidente em 2002, o que refuta parte da hipótese de Singer (2012) acerca do Lulismo.

Os dados do Quadro 2 confirmam a segunda hipótese aqui apresentada. Os eleitores de baixa renda, em 2006, tendem a votar em Lula, a avaliar bem o governo, a não participar de manifestações ou protestos e a se posicionar mais à direita no espectro ideológico.

E os dados do Quadro 3, finalmente, mostram que a avaliação de governo é a variável que mais explica o voto em 2002 e 2006 (a avaliação positiva do governo em vigor leva ao voto no candidato governista). A participação em manifestações ou protestos explica o voto para presidente apenas em 2002 e com um coeficiente mais baixo do que a avaliação de governo. O posicionamento ideológico, por sua vez, explica a decisão do voto para presidente em 2002 e no 1º turno de 2006. Eleitores posicionados mais à esquerda tendem a votar mais em Lula do que eleitores posicionados à direita e ao centro. E a renda explica o voto para presidente apenas em 2006 e com um baixo coeficiente de contingência. Ou seja, eleitores de baixa renda, em 2006, tendem a votar mais em Lula do que os demais eleitores.

REFERÊNCIAS

SINGER, André. Os sentidos do Lulismo: reforma gradual e pacto conservador. São Paulo. Cia. das Letras, 2012.

BOITO JR, Armando. O lulismo é um tipo de bonapartismo? Uma crítica às teses de André Singer. Crítica Marxista, Campinas, n. 37, p. 171-181, 2013.